Agroecossistemas, Capitalismo Verde, Cosmovisões, Educação Politécnica e Agroecologia. Esses são alguns dos verbetes do Dicionário de Agroecologia e Educação, lançado oficialmente no dia 12 de abril, pela Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), com apoio da Presidência da Fiocruz, e pelas lideranças do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), e em parceria com a editora Expressão Popular. Ao todo, são 106 verbetes, elaborados por 169 autores de 68 instituições distintas – universidades públicas, institutos federais de educação, movimentos sociais, institutos de pesquisa – e com representação de autores da Argentina, Guatemala e México, ao lado de pesquisadores e educadores brasileiros. Para a construção da obra, foram tomados como referências o Dicionário de Educação Profissional em Saúde e o Dicionário da Educação do Campo.

“A EPSJV foi chamada a cumprir essa tarefa por ser uma unidade que, há cerca de 17 anos, vem realizando uma série de parcerias no âmbito da pesquisa e da educação em saúde junto ao MST, o que nos possibilitou ir construindo uma criticidade sobre as possibilidades e desafios que se enfrentam no campo brasileiro”, ressalta a professora-pesquisadora da Escola Politécnica, Anakeila Stauffer, que organizou a obra em conjunto com o também professor-pesquisador da EPSJV, Alexandre Pessoa, e com Maria Cristina Vargas e Luiz Henrique Gomes de Moura, militantes do MST.

Na apresentação da obra, a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade, ressalta que o Dicionário contribui para o conhecimento sobre a multiplicidade de experiências nacionais e locais que dão vida ao conceito de Agroecologia. “Resultado de um esforço coordenado, não se trata de uma simples reunião de temas, mas de um projeto integrado baseado em amplo diálogo que envolveu a produção coletiva da obra. O próprio processo de sua construção foi orientado pela perspectiva de se construir conjuntamente uma Pedagogia da Agroecologia”, afirma.

Construção do livro

O dicionário reuniu uma série de estudiosos e militantes da área, que contribuíram no processo de concepção e elaboração dos verbetes. Desde o início, eles propuseram a construção de eixos fundamentais, temas e verbetes que pudessem delinear um breve histórico dos conceitos relacionados à Agroecologia. “A obra está direcionada à educação de cada educador e educadora que não está responsável, somente, pela educação de novas gerações, mas também por sua autoeducação. Se somos produtos de um tempo histórico, também podemos transformar a forma como esse mundo é”, aponta Anakeila.

Na visão de Alexandre Pessoa, a experiência de construção coletiva do dicionário é fruto da convergência de movimentos sociais do campo, da floresta, das águas, das periferias e comunidades urbanas, sujeitos políticos e pedagógicos que lutam pela promoção da saúde e da vida e pela emancipação social. “Diante da grave crise ecológica e de destino, a agroecologia, enquanto processo que envolve ciência, trabalho camponês e movimento popular, se apresenta com uma emergência, uma vez que precisamos, com urgência, superar as relações de exploração, opressão e destruição entre capital-trabalho e capital-natureza. Frente ao atraso das monoculturas das terras e das mentes, o dicionário é uma expressão de resistência e compromisso com o esperançar”, afirma.

Para Anakeila, o tema da Agroecologia é de suma importância, pois reúne tanto as práticas e os conhecimentos provenientes da base camponesa e de distintos povos originários, como os conhecimentos científicos diversos, as relações sociais, a busca da superação de relações de opressão e exploração, as lutas políticas e as práticas educativas pautadas em movimentos populares. Segundo ela, a Agroecologia coloca no centro do debate as origens, junta ciência e ancestralidade, busca romper com o socio metabolismo imposto pelo capital e contribuir na constituição de novas relações na direção da emancipação humana. “No que tange ao enfrentamento ao capital, ela se torna mais uma ferramenta de denúncia da perversidade da forma de produzir imposto pelo capital no campo e nas cidades, com a privatização dos bens comuns, a destruição da natureza, a concentração da terra, os pacotes tecnológicos que implementam um verdadeiro deserto verde e o consumo exacerbado de agrotóxicos”, aponta.

No entanto, a organizadora contrapõe que a Agroecologia não serve somente de denúncia, mas também de anúncio. “Anúncio da possibilidade de criação de relações mais horizontalizadas no processo de produção que se institui a partir da organização coletiva popular, na instituição de uma relação mais saudável e respeitosa com a natureza, colocando o ser humano como parte constitutiva dessa natureza e não como aquele que a domina e explora”, explica. E dessa forma, a Agroecologia se constitui, de acordo com Anakeila, como a alternativa possível para a produção de alimentos e de matérias-primas, assim como para o restabelecimento do metabolismo socioecológico.

Na visão de Luiz Henrique, a sociedade vive em um período histórico em que as formas de exploração capitalistas do ser humano e da natureza produzem cada vez mais destruição e sofrimento. A natureza, segundo ele, é vista como inimiga e deve ser constantemente combatida. “O agronegócio, por exemplo, como expressão capitalista de organização da agricultura, se expõe cada vez mais como motor que movimenta e articula o desmatamento, a queimada, o envenenamento sistemático do meio ambiente e das pessoas por meio dos agrotóxicos, o consumo insano da água e a transformação de milhões de hectares em produtores de commodities, não de alimentos”, reafirma.

Nesse contexto, Luiz aponta que as forças populares têm produzido soluções concretas para as necessidades sociais e ecológicas. “A soberania alimentar, a agroecologia e o cuidados dos bens comuns, como a terra, a água e a biodiversidade, são bases de uma sociedade onde as pessoas e a natureza estão no centro, não o lucro. O abastecimento das famílias trabalhadoras com alimentos saudáveis – só possível a partir da realização da reforma agrária popular – é hoje um dos objetivos centrais de um projeto popular para nosso Brasil”, defende. E acrescenta: “O objetivo desse dicionário não é catalogar a totalidade da agroecologia. É, sim, popularizar os conceitos, as categorias e as técnicas agroecológicas que permitem justamente pensar esse novo projeto de campo e sua relação com o projeto de país”.

Segundo Maria Cristina, nos últimos anos, o MST tem intensificado a formação de educadores das escolas de educação básica em torno do tema Agroecologia, pois, na visão dela, a educação escolar pode contribuir para o fortalecimento da Agroecologia e da agricultura camponesa como modo de vida. “Temos o grande desafio de inserir nos processos escolares conhecimentos que possam superar a forma tradicional com que é tratada a história da agricultura e a ecologia. Nesse sentido, a produção de materiais que contribuam para subsidiar os educadores e educadoras é fundamental”, aponta.

Cristina afirma que, nesse contexto, já existem outras duas obras pela Editora Expressão Popular: De onde vem nossa comida? e Agroecologia na Educação Básica. “Agora estamos com essa importante obra construída a muitas mãos. Seguimos esse caminho de dialogar com as inúmeras entidades e pessoas que integram a construção política pedagógica e científica da Agroecologia e sua interface com a educação”, disse.

“Em um momento de profunda degradação ambiental, da mercantilização da vida, da destruição dos laços e da solidariedade humana, enfim, de exacerbamento do modo de vida aniquilador produzido pelo capitalismo, trazer uma obra como essa é um oxigênio que nos fornece a práxis para a construção de outras formas de ser nesse mundo”, conclui Anakeila.

Acesse aqui o dicionário.

Dia do lançamento: 12/4
Local: Sala 106 – Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – Av. Brasil – 4365 – Manguinhos – Rio de Janeiro – RJ
Hora: 9h
Transmissão:

Fonte: Agência Fiocruz de Notícias

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